quarta-feira, 31 de dezembro de 2008





Um neófito artrítico

Antunes Ferreira
Enquanto o triste do novo ano já está à espera de sair do gineceu e inclusive se desenferrujou a tesoura para lhe cortar o cordão umbilical, este velhíssimo, a cair de podre, encontra-se instalado no caixão e na antecâmara, breve de perder o pio e soltar o último arroto. Sem coroas de floristas nem coroas das outras, daquelas com que se compram os melões. Que, diga-se, estão pelas horas da morte, donde a citação.

Este abstruso 2008, que ora exala os últimos suspiros, não deixa memória que se preze. Daí que pense, convictamente, que ao lado do seu execrável velório existam apenas duas personagens que riem descarada e despudoradamente: a Dona Branca e o Mister McCain. Dos restantes seis mil e seiscentos mil milhões de desgraçados humanos que sobrevivem no planeta azul, nada consta.

Explico: a ilustre Senhora, muito justamente chamada a Banqueira do Povo, ainda que na cela, ter-se-á sentido antes na sela, cavalgando o contentamento. O seu exemplo fora finalmente seguido e, até, aumentado, pelo cidadão made in USA Bernard Lawrence Madoff. Se ela tivesse registado a patente, hoje, para além das gargalhadas estaria trimilionária pelos direitos de autor, mesmo descontando o IRS.

Quanto ao derrotado John Sidney McCain III, as bandeiras despregadas do seu riso justificam-se plenamente. Olha se tivesse ganho? O sarilho em que te tinha metido, mesmo que acompanhado pela inefável Sarah? O pobre do vencedor Barak Obama é que se meteu numa camisa de mil cento e onze varas, depois das urnas. Ninguém neste Mundo ou «no outro» (onde?) apanhou uma tal herança.

Realmente, herdeiro de uma crise que lhe explodiu nos braços, sem que nela tivesse qualquer responsabilidade, o novo inquilino da Casa Branca tem um futuro muito negro. É pai sem saber como, à semelhança do São José. Hoje, a existirem presentes (?) eles são esmagadoramente envenenados. A maioria sabe-o desde há muito. Obama mastiga-o agora. E, o que é pior, não o pode deitar fora.

Há, claro, umas quantas excepções, mas não passam disso mesmo, não servem senão para confirmar este ratio mesquinho. No caso português, e já nos chega este, arrisco-me a citar o Nelson Évora, o Cristiano Ronaldo, um primo afastado do Zé Povinho, a Marisa e… Nem o Saramago escapa, acusado de plagiar o tal mexicano Teófilo Huerta Moreno. Assim vai este mísero País, ainda que com o OE aprovado e o Estatuto dos Açores promulgado.

Balanço destes desgraçados 365 dias a que só falta o coveiro, a encomendação já está feita, seria, apara além de despiciendo, redondamente parvo. A balançar andaram eles todos, os das 24 horas e os que pensam que os protagonizaram. Leve-os o vento, para que não caia no pecado de neles pensar - apenas.

O novo ano, esse, coitado, já nasce de muletas, artrite generalizada, a caminho de sidoso e carregado de cáries dentárias, ainda que oficialmente desdentado, por mor da tenríssima idade que terá daqui a umas horas. Nem sabe, o infante, onde se vai meter. Devia existir um Sindicato dos Neófitos para valer nestas circunstâncias ao sócio que dele precisasse. É o começo – do fim.

Também publicado em www.aminhatravessadoferreira.blogspot.com e www.cuaoleu.blogspot.com

2009 - Que se f... lixe a crise



2009

- O Ano de todas as desilusões ou... O ano do VAMOS CURTIR COMO SE NÃO HOUVESSE AMANHÃ! -

Recessão? Desemprego? BCP, BPN, Bê U Quê?!? Novo Código de Trabalho? Avaliação de Professores?

Que se f... lixe a crise mundial. Graças a Deus, tenho uma educação católica. Deus não fecha uma porta sem abrir uma janela, Deus tarda mas não falha, Deus dará, enfim. Quando os putos lá de casa tiverem fome, sempre há as peregrinações a Fátima, dizem que dão "buchas" e minis aos peregrinos, e, não esquecer, o programa da não menos milagreira - talvez menos santa -Fátima Lopes.

Por tudo isto, não deixes para depois o que podes fazer já, hoje vai ser COMER E BEBER COMO SE NÃO HOUVESSE AMANHÃ!

Vivam os amigos, viva a família, viva eu.

AS

sábado, 22 de novembro de 2008




XUXUXUTANDO

A desafinação nacional





Antunes Ferreira
P
ecado confessado é pecado meio perdoado, diz quem sabe, neste caso o Povo, de cuja voz também se afirma que é a de Deus. Máxima que parece ter caído em saco roto, apesar de alguns, mais crentes, ainda a aceitem. Mas, convenhamos, o que era ontem pecado, hoje já não é – e, em certos casos, é até uma quase virtude. Quer se queira, quer não, as coisas já não são o que eram. Por uma segunda vez consecutiva, falo de futebol. O que para nós Portugueses não é óbice, dado que é o tema nacional por excelência. Mas, além do «Desporto Rei», há mais.

Já no que respeita à voz do Povo ser a voz de Deus, nada mais desactualizado, no mínimo. Os decibéis do Povo serão iguais ou, no mínimo, semelhantes aos que a Divindade utiliza? Creio bem que não. Nesta época em que os sintetizadores são reis, as vibrações vocálicas andam um tanto abastardadas. Há uns anos falava-se no dó de peito. Agora, comenta-se que metem dó. Prismas.
São os danados dos chips, são sim senhor, que deram cabo do que era inatacável. Há quem diga mesmo que nos dias que vão correndo os registos sonoros, de tão aviltados, distorcidos, desmotivados, só justificam a rouquidão em treinadores de futebol no final do jogo – ou em animadores de manifestações, ao volante de veículo dotado de altifalantes condicentes com.

Tomem-se três exemplos. Depois do cataclismo ocorrido na cidade de Gama, ali ao pé de Brasília, o técnico (?) luso Carlos Queirós veio dizer que a equipa (?), perdão, os dez jogadores restantes, não sabe jogar para o Cristiano Ronaldo, como acontece no Manchester. O dito treinador (?) era ou não era ajudante do Sir Ferguson? Não é capaz de trazer para a selecção o que ali se esforçava por aprender com o mestre? Neste caso, apetece referir que o Povo também não tem pejo em afirmar que vozes de burro não chegam aos céus. Com todas as letras, sem tirar nem pôr.

Outro: a operação Fair Play. Detonada a ocorrência, veio a Procuradoria Geral da República informar que «foi possível recolher prova para indiciar os arguidos, que se organizaram no âmbito da claque de futebol denominada No Name Boys, pela prática de vários ilícitos criminais, designadamente dos crimes de associação criminosa, posse e tráfico de armas de fogo, tráfico de estupefacientes, ofensa à integridade física qualificada, roubo, incêndio, explosões e outras condutas violentas especialmente perigosas». E mais.

O texto da PGR veio sublinhar a acção da polícia face à «firme determinação de combater o sentimento de impunidade existente em alguns sectores da sociedade portuguesa, sejam eles quais forem, o que só poderá resultar de uma eficaz articulação entre o Ministério Público e todos os órgãos de polícia criminal, como vem sendo incentivada». Neste particular, esta voz é quase semelhante à da Callas. Boa, excelente.

Finalmente, o caso BNP e a detenção do seu ex-presidente José Oliveira e Costa, antigo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de um governo Cavaco Silva. Foi ouvido na Boa Hora, reza a Comunicação Social, durante cerca de nove horas. E pronunciado por sete crimes. Continua em prisão preventiva. Mas também se acrescenta que quando foi detido, o referido cidadão estava acamado em sua casa. Não se ouviram declarações aos advogados do arguido quando terminou o interrogatório deste. Assim, sem voz.

Fico por aqui. Ainda pensei em apontar ainda a voz da Dr.ª Manuela Ferreira Leite opinando sobre a suspensão por seis meses da democracia. Mas, de tanto que se tem dito e escrito, nem valia a pena. Não vale. País desafinado, o nosso. Demasiadas vozes e nenhuma harmonia. Musicalmente falando – e não só. Há quanto tempo não usava esta expressão…

(Também publicado nos blogues Sorumbático, Cuaoléu e A Minha Travessa do Ferreira)


quarta-feira, 19 de novembro de 2008




Perdido no Sinai

Antunes Ferreira
Tendo saído com alguma rapidez, por mor de um marido mais irascível, da faixa de Gaza, Abou Hamad, um militante do Hamas, perdeu-se no deserto do Sinai. A gasolina do seu jipe acabara e ele já andava a pé há três dias. Com a pressa da saída, levara apenas duas garrafas de água que rapidamente esvaziou. Estava podre de sede.

No céu sem nuvens, alguns abutres volteavam seguindo-o. Abou, desvairado, não parava, não fosse o Imundo tecê-las e as rapinas avançassem para uma refeição cada vez mais magra e ressequida. Os pés ardiam-lhe em contacto com a areia escaldante. Sol a pique, esplendoroso, aquecia o solo e ajudava a que ele, cada minuto que passava, mais sequioso, se possível, estivesse.

Nisto, ao virar de uma duna, depara-se-lhe um infame judeu. Quis lá saber do Profeta e da guerra. Chegou-se-lhe ao pé e suplicou ao infiel que lhe arranjasse um copito, vá lá, dois, de água mesmo que fosse del cano. Isaac Jacob moveu-lhe os dedos negativamente. Água, nem pó. Mas, era vendedor de gravatas. Uns modelos italianos, de seda…E apenas uns cem dolarezitos…

Ah cão, pensou Hamad. Porém, não disse. Sabe-se lá o que a sorte reserva a um homem temente a Allah… Nunca fiando. Porra, mas para que quereria ele as sacanas das gravatas do porco do judeu??? Meu Senhor, nem que fosse destilada, daquela prás injecções, um dedal. Nada mais. Estou a morrer de sede. Eu vejo. Mas eu sou mais gravatas. No entanto, posso dar-lhe uma informação. Ora essa, por quem é. Desde que seja sobre o H2O…

O Senhor segue em frente, daqui a duas dunas vira à sua direita, segue de novo em frente e à terceira duna vai avistar um bar. Garanto-lhe que ali há água fresquíssima, tiradinha do frigorífico e, até, um chá frio que nem lhe conto. Refrigerantes light, o que quiser. Não diga mais nada, caríssimo. É pra já.

Duas horas depois, ei-lo de volta e chegando-se ao Isaac. Já vinha com a carteira aberta e contava as notas do imperialismo. Então? Já está melhorzinho? O caraças!!!O fideputa do seu irmão dono do bar só permite a entrada a tipos com gravata. Grande sacana!!!

NE - A estória foi-me enviada via imeile por diversos cidadãos. Daí que não mencione aqui um nome em especial. Vários, bastantes, foram. A quem, reconhecido, agradeço as atenções. No entanto, e apesar de lhe ter vestido fato novo, não podia reivindicar para mim as glórias neste caso inconsequentes. Sic transit gloria mundi…

(Volto aqui, ao fim de uns mesitos. Aliás, pelo andar da carruagem, sou eu que devo andar perdido no deserto... Ó Dona Aninhas: se vocemecê fizesse "algum", não me parecia, de todo, mal...)

Também publicado em A Minha Travessa do Ferreira


sexta-feira, 12 de setembro de 2008




…ao fundo do túnel

Antunes Ferreira
É sabido, consabido e, até, multissabido (deixem-me pleonasmear ou neologismar…) que é universal a asserção «uma luz ao fundo do túnel». Em Portugal, Mário Soares ficou ligado a ela quando tentou alimentar as esperanças dos Portugueses num futuro melhor, aquando dos momentos realmente muito difíceis que se viviam nos domínios financeiro e económico, quando o FMI era um examinador impiedoso face ao aluno cábula, desleixado e mal comportado que o nosso País era. Ficou gravado nas memórias de quase todos nós um nome: Tereza Ter-Minasian. E por aqui me fico.

Políticos, dirigentes, empresários, religiosos (são apenas uns parcos exemplos da panóplia universalizada) todos eles usam a expressão e, frequentemente, dela abusam. Serve para tudo, mas principalmente para anunciar caminhos perfeitos ou quase que contentem os cidadãos quanto ao futuro.

É utilizada, tão repetidamente e por tanta gente, que hoje é uma prostituta vulgar. Podia ser uma call-girl eufemísticamente rotulada. Mas, não. É uma… mulher de vida fácil, a que normalmente chamamos uma meretriz, sem receios puritano-linguísticos, uma puta. Pobre afirmação. Na sua raiz uma intenção esplêndida; no dia-a-dia, uma acusação cáustica: rameira.

A que vem este arrazoado? O destemperado propósito (?) do incêndio ocorrido na quinta-feira no Túnel sob a Mancha. Desde a sua inauguração em 1994, aconteceram nele apenas dois desastres complicados, qualquer deles incêndios, As pessoas que o utilizam podem, naturalmente, comentar, olá, que boa trampa nos saiu esta prenda. Dois acidentes graves em 14 anos, para além de outros, menores, é obra, é preocupante, é o diabo.

Para os proprietários do segundo maior túnel do Mundo – registe-se, a título informativo e rememorativo que o primeiro é japonês – o comentário é bem outro. Em 14 anos de existência, só se verificaram dois eventos de proporções grandes e, felizmente, sem vítimas mortais em qualquer deles. Não é o caso do copo quase vazio para uns e quase cheio para outros: nele a água está a metade do recipiente. Quem não o está são os que emitem as opiniões.

O incêndio, de acordo com fontes oficiais, foi extinto umas quantas horas depois de ter deflagrado. Ele deveu-se a um camião cisterna que transportava materiais inflamáveis e que terá tombado. O fogo que aconteceu espalhou-se a outras cerca de 30 viaturas. Seis camionistas receberam cuidados hospitalares devido à inalação de fumo.

A Lusa e a RTP conseguiram contactar um condutor de um camião português, Eric Costa que informou que outros portugueses tinham sido também «encurralados» no Eurotúnel por via do acidente. As diligências para que se tivessem obtido tais resultados ficam com os seus autores, demonstrando, uma vez mais, que quando nos metemos de cabeça nas coisas mais complexas, conseguimos atingir os nossos objectivos. Somos, regra geral e como o tenho escrito, mauzinhos. Mas, por vezes…

Neste novo caso da passagem subterrânea do canal da Mancha bem se pode dizer que, para os que ficaram apanhados na ratoeira, foi muito difícil encontrar a famosa luz ao fundo do túnel. As conclusões do imbróglio seguirão dentro dos momentos que sejam considerados necessários. Há, porém, uma que já se pode apontar. Nele não dever haver acusações contra José Sócrates ou contra o seu Governo. Desta – safaram-se. O que é cada vez mais raro. Já quanto a Carlos Queiroz…
(Também publicado em http://www.travessadoferreira.blogspot.com/, em http://www.sorumbatico.blogspot.com/ e em mais uns quantos. Um dia destes, lá vem a graçola: máquina de encher chouriços...)

terça-feira, 9 de setembro de 2008

A Fé nos Homens



Ao que chegámos? O que nos transformou de tal forma, que assumimos em toda a gente um criminoso, um raptor, um assassino?
Ainda esta semana falava com os meus colegas, acerca da Festa do Avante nos meus tempos de menino, em que os pais podiam levar as crianças sem preocupações, bastava apenas as palavras "Se nos perdermos encontramo-nos aqui!". Tal, de facto, acontecia várias vezes.

Desta vez o pânico tocou-nos à porta. Perdemos a nossa filha de vista por 5 minutos. As coisas que nos passaram pela cabeça, o desespero, o sentimento de que a nossa vida ia acabar ali. E porquê? Será que de facto existirá uma qualquer conspiração para nos conseguir manter aterrorizados? As notícias que vemos de crimes e criminosos impunes? Que raio se passa que, em vez de vermos em cada ser humano um irmão passámos a ver um assassino?

O que fará das pessoas seres humanos? Deveremos nós dar direitos a quem não os respeita?

Uma coisa é certa, a liberdade e segurança que outrora sentimos dificilmente voltará a existir.




Assina: Kristek

...“so called Economists” - Sleeping on the Job


Circula nos corredores o rumor de que o chefe (leia-se Director Geral) está a dormir na casa de banho. Mas onde é que vamos parar?
Confirma-se! Mais de uma hora, este gajo é bom!

Primeiro essa onda de banditagem, onde se assaltam bancos e roubam ATM’s;

Agora, até os elementos que vêm do estrangeiro, muito bem recomendados, para chefiar as nossas empresas, vão DORMIR PARA A CASA DE BANHO!!!

Ora o meu “Muito Obrigada” aos líderes das Multinacionais que têm estas subsidiárias no nosso país, que nos mandam estes tipos porreiros para liderar as empresas outrora edificadas e geridas por portugueses com tanto “sangue suor e lágrimas”!

E perguntam-me, mas,... obrigada?
Porquê?
Porque esse sujeito é um bacano, só pode! Deve dar aumentos a torto e a direito...

É bacano. Sem dúvida!

Aumentos? Nem por isso, não chega a ter a noção das necessidades dos empregados, ou dos portugueses; deve ser por ter um ordenado chorudo, carro, telefone, etc, e quem sabe, talvez por também passar muito tempo a dormir.

Mas a questão é... – é assim que vai a Economia do nosso País –, quando esta subsidiária afundar, certamente que lhe vão arranjar outra para gerir.

Obrigadinha ó Bacanos!

Assina: La Golondrina

sábado, 6 de setembro de 2008



VIRA O DISCO E… TOCA O MESMO

Hipocondríaco

Antunes Ferreira
bois que se exportam, há bois que se importam e há bois que… não se importam. A afirmação é calina de repetida, mas serve perfeitamente para mais este Vira o disco… e toca o mesmo. Porque esta é a estória dum exemplo destes últimos. Mais precisamente o Serafim Malaquias, porteiro, reformado da Função Pública, mas em muito bom estado. Na sua, dele, opinião.

Malaquias tinha casado pela quarta vez, era viúvo praticante, enterrara a Manela, a Julinha e a Lena, tadinhas. Especialista em gravata preta e fumo no braço, já se podia considerar um expert em velórios maritais. Mais correctamente, viuvais. De repente, descobrira a Micas, empregada na Fruta Fácil, FF, frutaria de qualidade, países de origem afixados, como mandava a ASAE.

Ver-te e amar-te foi-obra-de-um-momento. No Registo Civil, de que era frequentador frequente, tão bem o conheciam que já nem lhe pediram o BI. A Micas resplandecia, empunhando, qual Duarte d’Almeida, mas com mãos e calçadas de luvas brancas, o ramo a que alguns chamavam buquê. Vá lá saber-se puquê…

Tinha vinte e quatro risonhas Primaveras, enquanto que o Serafim já ia nos sessenta e muitos. Mas, o Amor não escolhe idades. O apartamento de porteiro, que já albergara a última donzela, a Lena, passou, assim a ter uma nova inquilina – a nova bis Miquelina da Purificação do Ó, para os amigos, Micas.

Especialmente para um amigo, o Necas, motorista afrutado e afortunado, que, na sequência de antigos mimos e carinhos e face à notória diferença etária dos esposos, vai daí continuou a atira-se à fruta micanita que era um vê-se-te-avias. Logo duas semanas depois do casório. Ainda por cima – ou por baixo, à vontade dos leitores. O Malaquias, alertado por alguém, deu-se conta disso.

Raio de sorte. Se três enterros já bastavam, agora vinha este – e dele. Nem pó. Fez-se por desencontrado, ainda que as más-línguas lhe chamassem já, não o porteiro do prédio, mas o corneteiro. Infâmias. Mas, como dizia o outro, vozes de burro não chegam ao… décimo segundo andar do imóvel. Ao décimo ainda vá que não vá.

Um belo dia, depois de a marcar com a antecedência devida na Caixa, foi à consulta do médico de família. Entrou, pediu desculpa do incómodo ao Senhor Dótor, mas queria préguntar-le se ele, médico, achava que ele, Serafim era hipocondríaco. O clínico retorquiu-lhe que, nos doze anos que levava de o ver, nunca lhe notara a mania de ter doenças.

E ele – mas ó sôr Dótor, isto aqui pra nós, a minha mulher anda a enganar-me com outro mânfio. Todos os dias de manhã apalpo a testa e vejo-me ao espelho. Não tenho dores e os cornos nem sequer estão a sair. Será por falta de cálcio?


(Também publicado no www.travessadoferreira.blogspot.com, no www.cariricult.blogpot.com no www.eboraguebi.blogspot.com e no www.novaaguia.blogspot.com

quinta-feira, 4 de setembro de 2008



Somos todos ciganos

Antunes Ferreira
Em tempo salazarento Portugal era o País dos três efes: Fátima, Futebol e Fado. Hoje, Portugal é o País dos três efes: Fundos, Finanças e Futebol. A História, por mais que queiram que ela mude constante e permanentemente, bem ao contrário vai avançando com bastas repetições, mas, sobretudo, com muitas adaptações.



Somos, aliás, uma raça de adaptados – e de adoptados. Costumo dizer que somos ciganos. Não os dos tiros, das desordens, das feiras, dos roubos, da droga – que os há, como é sabido. Se calhar, também possuímos um qb destes nos cromossomas a que temos direito. Porem, aqui, é outro o conceito. Para constatar que somos uma mistura aciganada, basta que miremos a nossa genealogia.

Os residentes sem cartão mas residentes, começaram, segundo dizem, por ser os protoibéricos. Na fila (antigamente eu usava bicha, mas hoje…) encontramos de seguida os ibéricos, os lusitanos, os romanos, os vândalos, os suevos, os alanos, os visigodos, os mouros, e diversos outros que não menciono para não esgotar as listas de registo e as respectivas certidões. Mesmo assim, convém não esquecer os fenícios e os gregos. Muitos.



nos primórdios da nacionalidade, conta-se com um bolonhês e cruzados das mais diversas origens, tonalidades e defeitos, sem certificados de qualidade e de proveniência. Isto tudo misturado – miscigenado para usar palavra erudita que fica sempre bem em escrito – foi originando o Português. E vieram os Descobrimentos. Mais achas para a fogueira. Pretos, indianos, malaios, chineses, coreanos, tailandeses, chinês, japoneses, timorenses. É obra.

Bom, já o tenho escrito, nós colonizámos sobretudo na cama. É esta comezinha constatação, no meu mais do que modesto entender, que pôde justificar a afirmação de que a nossa colonização foi diferente de outras, ou, mesmo, das outras. Não terá sido completamente assim. Mas quem é o escriba para assim perorar, se a mulher com quem casou de igreja e tabelião, é… Goesa?

Acrescento só mais uma pequena «ocorrência». O nosso terceiro e último filho nasceu em Luanda. Quando já nos reinstaláramos em Portugal, findos os anos de Angola, fomos registá-lo na Conservatória dos Registos Centrais. O zeloso funcionário encarregado de fazer o assento, perguntou o nome do rapazito: Luís Carlos etc. Natural de? Luanda. Filho de? Henrique torna e deixa, natural de Lisboa, freguesia de São Sebastião da Pedreira (há uma caterva deles). E de Raquel tal e modos, natural de Raia, concelho de Salcete, antigo Estado Português da Índia. Abreviando: as duas testemunhas arregimentadas à porta conservatorial, eram, um moçambicano, e o outro, damanense. Palavra de honra.


O agente administrativo apontou tudo cuidadosa e conscientemente, à mão, naturalmente, no livro de registos monumental, leu o escrito e deu para assinar. Finalmente, fê-lo ele próprio. Só por pura curiosidade e face ao fácies, perguntei-lhe de onde era. Do Mindelo, Ilha de São Vicente, Cabo Verde.

Saímos, agradeci às testemunhas e paguei-lhes o combinado, já que nunca nos tinham visto, sendo que um era amigo de um primo da Raquel, da Beira e outro conhecido do meu sogro que fora director da Alfândega de Damão. E foram à vida deles. E nós, à nossa. Um slogan então muito na moda referindo a banca, saltou de imediato do Paulo o meu do meio: «Olha, agora és nacionalizado, nosso»…

E logo o Miguel, o primogénito, plantou uma alcunha no pimpolho com os seus quatro anos: «a partir de hoje, és o tuti-fruti».E depois, digam-me lá se somos ou não somos ciganos?

(Também publicada no www.sorumbatico e noutros, vários...)

terça-feira, 2 de setembro de 2008




VIRA O DISCO… E TOCA O MESMO
Uma nova posição


Antunes Ferreira
Algum tempo – mas pouco – depois do dia da Revolução, os trabalhadores da fábrica Meu Querido Patrão, já organizados em Comissão de, reuniram-se para decidir da gestão futura da unidade. O qu’rido bósse Serapião Sarzedas, mais conhecido pelo SS, basara apenas soubera do golpe. Gato escaldado…

Pessoal. Isto é para ir prá frentex! O orador, o Pinto, ganda pintarola, era já o Sicratário- giral. Vamos entrar por novos caminhos! Um dos presentes, a medo e à sorrelfa, perguntou – a pé, ou de vuátura? Ninguém lhe ligou pevide. Reaccionários sempre houve, carago.

Antes do mais. Quem é o camarada com piores condições aqui na empresa? Temos de ser todos iguais. O mesmo sussurro: mas uns mais do que os outros… Mau, Maria. Se descobrimos o sacana, é saneado e só não é fuzilado provisoriamente porque esta merda é uma revolução sem sangue, só cravos. Passaram à frente.

Era, indiscutivelmente, o Silva porteiro. Mil paus por mês, uma cagada em três actos. Pior: treze filhos, mulher ocupadíssima, ainda com tempo para fazer umas empadas para fora. Sempre ajudava. Pois’tá visto, o Silva. Chamou-se o homem. Camarada Silva, temos novidades para ti. O pobre do cidadão logo pensou para com os seus, dele, botões, estou frito, vou pró olho da rua, só m’acontecem desgraças, é tudo prejuízo, porra! Mas, nem piou. Falazar podia agravar…

Passas a ganhar dois mil e quinhentos escudos por mês e abono de família para os filhos. E, garanto-te em nome da CT, vamos arranjar-te uma nova posição! Estás contente? Se estava. Não lhe dera uma apopelacacia, ou algo assim, porque não calhara, nem tinha dinheiro para vícios. Amigos… (e o tal filho da puta sotto voce: camaradas, é o que agora se usa… ‘Da-se o gajo!)

Amigos, posso ir comunicar este monumento à minha Mariquinhas? Podes e deves. É pra já. E o Silva, ei-lo a correr desenfreado prá Graça, Rua sei lá de quem, quinto andar sem elevador. E sem GPS. Não sentia a quilometragem, muito menos as escadas galgadas a dois e dois. Nem se lembrou da chave. E boxeou valentemente a porta. Abriu-se. Ó homem-de-deus – o que aconteceu? Morreu alguém? Foste despedido? Nada, Mariquinhas, nada! Lá na fábrica vão arranjar-me uma nova posiçãooooooooo!!!!!

Um sorriso maroto na face dela:
- Ó homem!... Tu, também, só pensas nisso…


Esta é uma estória antiga, com barbas maiores do que as do Matusalem. Com ela, adaptada, que o mesmo é dizer embrulhada em papel novo, por este desgraçado escriba sentado nas pernas cruzadas à maneira hieroglífica, se inaugura a nova secção VIRA O DISCO… E TOCA O MESMO. Sem grande originalidade, diga-se. Mas bem melhor do que se fosse VIRAR A CASACA... Está também publicada no www.travessadoferreira.blospot.com

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Essa é que é Eça!

Abaixo o crime violento.
Viva o Ladrão Solitário!
Andava o desgraçadinho no gamanço, na horita do almoço. A hora do patrão lá do armazém era sagrada e um tipo quando é cumpridor é cumpridor! Era tão sozinho coitadinho, tão educadinho, até pedia desculpa ao funcinário bancário, e tão pouco ambicioso no que roubava que cativou o público em geral e fez voltar a sonhar a população feminina portuguesa com o, há muito desejado, herói romântico. Quem não desejaria ter um marido que, em vez de, na sua hora de almoço, ir comer à cantina mais próxima ou ir beber umas cervejas com tremoços com os amigos, se sacrificava em ir assaltar um qualquer banco, para oferecer quiça uma nova placa de fogão ou mesmo substituir o micro-ondas que, ultimamente em vez de aquecer estorrica a comidinha.
Desde a candidatura o nosso Primeiro que a mulher portuguesa não suspirava com tanto fervor.A mulher portuguesa, pela sua generosidade latente, tem e terá sempre a necessidade de acreditar no bom malandro.
Os Camarinhas ficam para as camones! Essas sim, ainda apreciam o vagar das coisas cá pelo burgo.
E agora um Viva especial para o Jacinto, que se cagou (não tenho outra forma de me exprimir) para Paris de França e cá por Tornes procriou, deliciado em cabidelas, arroz doce e vinho das Beiras!
Obrigada Chefe pela bela prosa.
AS
PINÇAMÊTOS PROFUND...ÍÇIMOS

Pior que uma pedra no sapato...
…só um grão de areia no preservativo…
A.F.
O crime na internet

Por Antunes Ferreira
Não duas sem três, dizia-se. Agora, sem margem para dúvidas, não há dias sem muitos. Leia-se: actos criminosos. Aqui há umas semanas rabisquei aqui uma «coisa» em que dizia, mais ou menos, «vou ali assaltar o banco e volto num instante». Agora, no mínimo, terei de utilizar muitos plurais. Demasiados, infelizmente.

Por estes conturbados tempos, aqui em Portugal, há de tudo: para além dos já calinos assaltos a bancos e outros alvos, rouba-se, a dinamite em plena auto-estrada, mata-se quem quer que seja, sobretudo porque o infeliz tentou negar-se a entregar a carteira, o cartão de crédito, e muito mais. Como o nosso Povo comenta, mata-se, esfola-se, viola-se, vigariza-se e rouba-se.

Estamos feitos. Estaremos? Tudo aponta para isso. Os «brandos costumes» característicos dos Portugueses estão, como estavam os dinossauros, em vias de extinção. E as imensas quantidades de armas que «andam por aí» ajudam e participam. E entram, ao contrário dos testículos.

A violência, como tudo o resto, não é um exclusivo made in Portugal. Estende-se pelo Mundo inteiro, tem tentáculos aos milhões, pobre do polvo nas suas limitações. Mas, como dizia o Jacintinho de Tormes, tudo chega atrasado a Portugal, Zé Fernandes. Ou algo assim. Em «A Cidade e as Serras», o Eça botou lá tudo. Lixado, o Queiroz. Não me refiro ao seleccionador nacional, claro.

Realmente do seu Paris natal até ao seu País de origem, as coisas demoravam o seu tempo a chegar. Ainda que viessem de comboio – vinham au ralenti. Logo na Estação de Tormes, quando se voltou para trás, já a caminho da quinta, e viu o zeloso chefe inclinado no cesto do lixo, a apanhar avidamente as revistas de mulheres nuas que trouxera da Cidade-Luz, ele acentuara a ideia mater.

Até as modas. As de senhora e as do procedimento. Diabo. Entrámos, portanto, no crime violento – atrasados. Sorte malvada. E não se diga que tal acontece por sermos… um País periférico. A União (???) Europeia, ainda e só considera a (des)qualificação para a Madeira e para os Açores. Nada disso. Progredimos à nossa velocidade de cruzeiro, mas progredimos. Devagarinho? Não nos podemos cansar muito. O clima-que-temos é quem paga as culpas.

Quando escrevo estas linhas, acabei de ler, no CM, que «são jovens, moram nos subúrbios das grandes cidades e apelam ao crime de forma directa. Ostentam armas, objectos roubados e desafiam a polícia. Estão espalhados na internet, não escondem o rosto e definem-se como bandidos». Ou seja, as novíssimas tecnologias aplicadas ao crime. Estamos bem. Estamos na onda. Somos bué da fixes, actualizados. Progredimos.

O combate a e, sobretudo a prevenção destes procedimentos, vai ser duro, complexo e dificílimo. Vencê-lo-emos? Seria bom que, no mínimo, o limitássemos e o fossemos atenuando. Singular convergência: PR, Governo, Oposição e PGR estão em consonância. Ainda bem. Neste particular, não há lugar para os famigerados «brandos costumes».
Também, e como habitualmente, publicado no http://www.travessadoferreira.blogspot.com/, no cariricult.blogspot.com e no http://www.sorumbatico.blogspot.com/

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Horas no Éden

"(...)
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.
(...)"

José Régio - Cântico Negro